Texto Base: Atos 6:8-15; 7:54-60.
“Mas ele, estando cheio do Espírito Santo e fixando os olhos no céu, viu a glória de Deus e Jesus, que estava à direita de Deus” (Atos 7:55).
Atos 6:
8.E Estêvão, cheio de fé e de poder, fazia prodígios e grandes sinais entre o povo.
9.E levantaram-se alguns que eram da sinagoga chamada dos Libertos, e dos cireneus, e dos alexandrinos, e dos que eram da Cilícia e da Ásia, e disputavam com Estêvão.
10.E não podiam resistir à sabedoria e ao Espírito com que falava.
11.Então, subornaram uns homens para que dissessem: Ouvimos-lhe proferir palavras blasfemas contra Moisés e contra Deus.
12.E excitaram o povo, os anciãos e os escribas; e, investindo com ele, o arrebataram e o levaram ao conselho.
13.Apresentaram falsas testemunhas, que diziam: Este homem não cessa de proferir palavras blasfemas contra este santo lugar e a lei;
14.porque nós lhe ouvimos dizer que esse Jesus Nazareno há de destruir este lugar e mudar os costumes que Moisés nos deu.
15.Então, todos os que estavam assentados no conselho, fixando os olhos nele, viram o seu rosto como o rosto de um anjo.
Atos 7
54. E, ouvindo eles isto, enfureciam-se em seu coração e rangiam os dentes contra ele.
55.Mas ele, estando cheio do Espírito Santo e fixando os olhos no céu, viu a glória de Deus e Jesus, que estava à direita de Deus,
56.e disse: Eis que vejo os céus abertos e o Filho do Homem, que está em pé à mão direita de Deus.
57.Mas eles gritaram com grande voz, taparam os ouvidos e arremeteram unânimes contra ele.
58.E, expulsando-o da cidade, o apedrejavam. E as testemunhas depuseram as suas vestes aos pés de um jovem chamado Saulo.
59.E apedrejaram a Estêvão, que em invocação dizia: Senhor Jesus, recebe o meu espírito.
60.E, pondo-se de joelhos, clamou com grande voz: Senhor, não lhes imputes este pecado. E, tendo dito isto, adormeceu.
INTRODUÇÃO
Nesta lição, estudaremos sobre a vida e o testemunho de Estêvão, um homem cheio de fé, sabedoria e do Espírito Santo, escolhido para servir na diaconia da igreja de Jerusalém (Atos 6:1-7). Estêvão se destacou não apenas pelo serviço, mas também por sua ousadia na defesa da fé e na proclamação do Evangelho. Mesmo diante de intensa oposição, falsas acusações e da ameaça de morte, permaneceu firme, priorizando a verdade e honrando a Cristo até o fim. Sua história nos mostra que viver o Evangelho, com fidelidade e compromisso, envolve riscos — inclusive o risco de enfrentar perseguição, rejeição e até o martírio. Contudo, assim como Estêvão contemplou a glória de Deus em meio à adversidade, a igreja é chamada a confiar, depender do Espírito Santo e perseverar na missão, sabendo que, acima de tudo, Deus sustenta e recompensa os que lhe são fiéis.
I. ESTÊVÃO E A IGREJA QUE TEM SUA FÉ CONTESTADA
Neste tópico I, aprenderemos lições profundas e extremamente relevantes para a Igreja contemporânea, baseadas na trajetória de Estêvão. A estrutura em três itens nos oferece um panorama claro de como a fé autêntica, vivida com poder e fidelidade, inevitavelmente será colocada à prova.
1. Aprendendo com Estevão
A vida e o ministério de Estêvão nos ensinam lições profundas e atuais sobre a fé cristã. Em Atos 6 e 7, vemos que a fé verdadeira não é isenta de questionamentos, oposição e até hostilidade. Estêvão era um homem cheio do Espírito Santo, sabedoria, fé e conhecimento das Escrituras — qualidades indispensáveis para quem deseja viver e testemunhar a fé de forma autêntica.
Sua experiência revela que todo cristão deve estar preparado não apenas para viver o Evangelho, mas também para defendê-lo com clareza, convicção e amor. Defender a fé, no contexto bíblico, não é opcional, mas uma responsabilidade espiritual. Como disse o apóstolo Pedro: “Estai sempre preparados para responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir razão da esperança que há em vós” (1Pd.3:15).
Contudo, a defesa da fé não se limita ao uso de argumentos; ela exige uma vida coerente, cheia do Espírito e disposta a enfrentar consequências. Estêvão não apenas argumentou; ele permaneceu firme, mesmo diante da perseguição e do martírio. Sua coragem nos ensina que a fidelidade a Cristo deve estar acima de qualquer medo, interesse pessoal ou preservação própria. A Igreja e cada cristão precisam compreender que, em muitos contextos, ser fiel ao Evangelho significa estar disposto a enfrentar rejeição, oposição, perseguição e, se necessário, até a morte.
Estêvão é, portanto, um modelo de alguém que não apenas conhecia a verdade, mas estava disposto a morrer por ela.
O que aprendemos neste item 1? Aprendemos que Estêvão é um exemplo completo de um cristão cheio do Espírito Santo, preparado para defender a fé com sabedoria, mansidão e firmeza. Ele nos ensina que:
📌Aplicação prática: Devemos investir em conhecimento bíblico e espiritual para sermos crentes maduros, prontos a defender a fé com equilíbrio entre sabedoria, amor e coragem. |
2. A fé sob ataque
“E levantaram-se alguns que eram da sinagoga chamada dos Libertos, e dos cireneus, e dos alexandrinos, e dos que eram da Cilícia e da Ásia, e disputavam com Estêvão” (Atos 6:9).
A trajetória de Estêvão evidencia uma verdade constante na história da Igreja: a fé cristã, quando vivida com autenticidade, inevitavelmente será alvo de oposição. Lucas relata que, enquanto realizava “grandes prodígios e sinais entre o povo” (Atos 6:8), Estêvão foi confrontado por um grupo de judeus helenistas — judeus da Diáspora, ou seja, judeus que viviam fora do território de Israel e eram profundamente influenciados pela cultura grega (Atos 6:9). Esses homens pertenciam a sinagogas compostas por estrangeiros e, sentindo-se ameaçados pela pregação de Estêvão, se levantaram contra ele.
O verbo grego “anístemi”, traduzido por “se levantaram”, é o mesmo usado na narrativa da paixão de Cristo, quando testemunhas falsas se levantaram para acusá-lo (Mc.14:57). Isso não é acidental. O ministério de Estêvão reflete o ministério do próprio Jesus, e assim como o Senhor foi caluniado, perseguido e condenado, seus seguidores fiéis também enfrentariam os mesmos desafios. O ataque não era apenas contra Estêvão, mas contra a mensagem que ele pregava — o Evangelho de Cristo.
O texto sugere que a motivação da oposição não foi apenas teológica, mas também emocional e social: inveja, resistência às mudanças e perda de influência religiosa. A pregação de Estêvão, acompanhada de sinais poderosos, estava esvaziando as sinagogas e provocando um desconforto entre os líderes religiosos. Eles perceberam que a mensagem do Evangelho não apenas desafiava suas tradições, mas também expunha sua hipocrisia e incapacidade de oferecer ao povo a verdadeira vida que só Cristo proporciona.
Essa realidade permanece atual. Sempre que a Igreja se posiciona de forma bíblica, pregando a verdade, vivendo em santidade e testemunhando com poder, o mundo, o sistema religioso corrompido e as forças espirituais das trevas se levantam para tentar calar a voz do Evangelho. A oposição à fé cristã não é acidental nem temporária, mas uma consequência natural de viver e proclamar os valores do Reino de Deus em um mundo que rejeita a luz.
Portanto, o exemplo de Estêvão nos ensina que a fidelidade a Cristo e ao seu Evangelho sempre terá um custo, mas também que vale a pena permanecer firme, confiando no Senhor, mesmo sob ataque.
O que aprendemos neste item 2? Aprendemos que, conforme o ministério de Estêvão nos mostra, a oposição à fé autêntica é inevitável, especialmente quando essa fé confronta estruturas religiosas e culturais rígidas. Como os judeus helenistas se levantaram contra ele, o mesmo ocorre com a Igreja de hoje quando se posiciona biblicamente. É válido salientar o seguinte:
📌Aplicação prática: Precisamos nos preparar espiritualmente para os conflitos que surgem da nossa fidelidade a Cristo, sem recuar ou negociar os princípios do Evangelho. |
3. A disputa com Estêvão
Estêvão não era apenas um homem de discurso eloquente, mas também de uma vida marcada pela graça, poder e sinais visíveis do agir de Deus (Atos 6:8). Seu testemunho combinava uma vida irrepreensível com obras incontestáveis. Sua pregação não se limitava às palavras, mas se manifestava também em ações que refletiam claramente o Reino de Deus. Ele falava ao coração, à razão e aos olhos — sua vida e seu ministério eram, ao mesmo tempo, um sermão e uma demonstração visível do poder de Deus.
Porém, como frequentemente acontece com aqueles que se posicionam fielmente pela verdade, seu ministério despertou uma reação intensa e hostil. A oposição ao ministério de Estêvão se desenrolou em três estágios bem definidos:
a) Discussão (Atos 6:9,10). Os judeus helenistas tentaram confrontar Estêvão em debates públicos. No entanto, “não podiam resistir à sabedoria e ao Espírito com que falava” (v.10). A palavra grega traduzida como “disputavam” sugere mais do que um simples debate; indica uma tentativa organizada de desconstruir seus argumentos, impor uma narrativa religiosa tradicional e, sobretudo, silenciar a mensagem do Evangelho. Isso mostra que, quando a verdade confronta estruturas religiosas estabelecidas, gera desconforto e resistência.
b) Difamação (Atos 6:11,12a). Não conseguindo vencê-lo pela razão nem pelos argumentos, recorreram à mentira e à difamação. Subornaram homens para acusá-lo falsamente de blasfêmia contra Moisés e contra Deus. Assim como fizeram com Jesus (Mc 14:57-58), montaram um tribunal de falsas testemunhas para descreditar não só Estêvão, mas também a mensagem que ele representava.
c) Condenação (Atos 6:12b–7:60). A difamação levou à prisão, e a prisão levou à condenação. Estêvão foi levado ao Sinédrio, o tribunal religioso máximo dos judeus. Ali, fez uma das defesas mais extraordinárias registradas na Bíblia, recapitulando a história de Israel e mostrando como, desde os patriarcas, o povo resistia constantemente à vontade de Deus. Seu discurso foi tão contundente que, incapazes de suportar a verdade, “rangiam os dentes contra ele” (Atos 7:54), e, movidos pela ira, o apedrejaram até a morte.
O texto deixa claro que não era um simples embate de ideias ou doutrinas. Era um conflito espiritual profundo entre a luz e as trevas, entre o Reino de Deus e os sistemas religiosos endurecidos. A hostilidade contra Estêvão não surgiu porque ele fazia algo errado, mas exatamente porque fazia o que era certo, e com poder, autoridade e sabedoria vindos do Espírito Santo.
Essa sequência — discussão, difamação e condenação — reflete uma realidade que ainda hoje se repete. Sempre que a Igreja se levanta com autoridade espiritual, fidelidade bíblica e demonstração do poder de Deus, ela se torna alvo de perseguição, mentiras e tentativas de silenciamento.
Estêvão, portanto, se torna um modelo de coragem, fidelidade e resistência, ensinando-nos que defender a fé exige não apenas conhecimento, mas também firmeza, coragem e dependência total do Espírito Santo.
O que aprendemos neste item 3? Aprendemos que a reação contra Estêvão seguiu uma escalada de oposição: debate → difamação → condenação. Isso mostra que, quando argumentos falham, os inimigos da fé partem para a mentira e a violência. Mas mesmo diante disso:
📌Aplicação prática: A Igreja precisa ser cheia do Espírito e viver com coerência e autoridade espiritual, para que seu testemunho tenha impacto, mesmo em contextos hostis. |
4. A falsa narrativa
“Então, subornaram uns homens para que dissessem: Ouvimos-lhe proferir palavras blasfemas contra Moisés e contra Deus” (Atos 6:11).
Ao longo da história, a Igreja de Cristo sempre foi alvo de falsas narrativas, criadas com o claro propósito de desacreditar sua mensagem, enfraquecer seu testemunho e, se possível, silenciá-la. Este é um mecanismo antigo, utilizado desde os tempos bíblicos, e que continua atuante nos dias atuais.
Nos dias de Jesus, essa prática foi evidente. Ele foi acusado de ser um enganador, que seduzia o povo (João 7:12). Mesmo após sua ressurreição, os líderes religiosos, incapazes de admitir o milagre, fabricaram a mentira de que os discípulos haviam roubado o corpo (Mateus 28:13-15), uma narrativa difundida e sustentada até os dias atuais em certos círculos.
O apóstolo Paulo também sofreu com isso. Foi falsamente acusado de ser um subversivo político, de se opor aos decretos de César (Atos 17:7), além de ser tachado de pregador de “deuses estranhos” (Atos 17:18) por anunciar Jesus e a ressurreição. Isso mostra que quando a verdade do Evangelho confronta ideologias, sistemas e interesses — sejam eles religiosos, políticos ou culturais — a reação quase sempre é construir mentiras para desqualificar a mensagem e o mensageiro.
O que vemos nos tempos bíblicos se repete hoje, em proporções ainda maiores e com instrumentos mais sofisticados. Através da mídia, da cultura, da educação e das redes sociais, surgem narrativas que tentam ridicularizar, distorcer e marginalizar a fé cristã. Algumas dessas falsas narrativas afirmam que:
· A Igreja é retrógrada, intolerante e inimiga da ciência e da liberdade.
· A fé cristã oprime, exclui e fomenta discursos de ódio, quando, na verdade, defende princípios de vida, amor, dignidade e justiça.
· A Bíblia é ultrapassada, machista e colonialista — uma visão distorcida que ignora seu papel civilizador, libertador e transformador de sociedades.
· Milagres e experiências espirituais são fruto de manipulação, charlatanismo ou ignorância.
Esses são apenas alguns exemplos de falsas narrativas modernas, construídas intencionalmente para desacreditar os valores cristãos e esvaziar a influência da Igreja na sociedade.
O que aprendemos, tanto com Jesus, quanto com Estêvão e Paulo, é que a Igreja não pode se calar nem ceder diante das mentiras. Pelo contrário, deve permanecer firme, defendendo a verdade com sabedoria, mansidão, amor e poder, como ensina o apóstolo Pedro: “Antes, santificai ao Senhor Deus em vossos corações; e estai sempre preparados para responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós” (1Pd.3:15).
Portanto, o combate às falsas narrativas não se faz com agressividade, mas com verdade, testemunho fiel, coerência de vida e dependência total do Espírito Santo. A verdade, mesmo atacada, jamais será destruída. E assim como Deus sustentou Estêvão, Jesus e os apóstolos, Ele continuará sustentando a sua Igreja até o fim.
O que aprendemos neste item 4? Este item nos alerta para uma estratégia antiga usada contra os servos de Deus: a distorção dos fatos para desacreditar a mensagem e o mensageiro. Foi exatamente isso que fizeram com Estêvão. Incapazes de resistir à sabedoria e ao Espírito Santo com que ele falava (Atos 6:10), seus opositores recrutaram falsas testemunhas e criaram uma narrativa mentirosa, acusando-o de blasfêmia contra Moisés e contra Deus (Atos 6:11-14). Isto nos ensina que:
📌Aplicação prática: A Igreja de hoje deve estar atenta e preparada para enfrentar falsas acusações. Precisamos manter nossa integridade e confiança no Senhor, sabendo que Ele é quem justifica os Seus. Mesmo quando formos mal interpretados ou caluniados, o nosso testemunho deve continuar sendo fiel, pacífico e cheio do Espírito. |
Resumo Didático do que aprendemos no tópico I: O exemplo de Estêvão nos ensina que:
👉Mensagem central: Em um mundo que contesta a fé, precisamos de cristãos como Estêvão — cheios do Espírito, corajosos, bíblicos e irrepreensíveis. |
II. ESTÊVÃO E A IGREJA QUE DEFENDE SUA FÉ
Este segundo tópico nos oferece uma profunda lição sobre o papel da Igreja como defensora da fé, ilustrado na figura de Estêvão, primeiro mártir cristão. Aprenderemos que defender a fé é mais do que argumentar: é proclamar a verdade com coragem, clareza e fidelidade a Cristo, mesmo diante da oposição.
1. Deus na história do seu povo
O discurso de Estêvão, registrado em Atos 7, não foi apenas uma defesa contra acusações infundadas, mas uma exposição teológica profunda, centrada na soberania de Deus e no cumprimento de seu plano redentivo. Estêvão demonstra ter um domínio notável das Escrituras e da história de Israel, interpretando os eventos do passado à luz da revelação de Cristo.
Ao revisitar a trajetória de Abraão, José, Moisés, e os profetas, Estêvão evidencia que Deus sempre conduziu seu povo, mesmo quando este resistiu ou rejeitou seus enviados. Assim, seu discurso não é apenas uma narrativa histórica, mas uma denúncia da constante resistência de Israel ao propósito divino, que culminou no ápice da rejeição: a crucificação do Messias, Jesus.
A defesa de Estêvão revela algo fundamental para a Igreja de todos os tempos: não existe verdadeira apologética cristã que não esteja fundamentada nas Escrituras e não aponte diretamente para Cristo. O objetivo não era apenas ganhar um debate ou se livrar das acusações, mas proclamar que toda a história da salvação converge em Jesus, o verdadeiro cumprimento das promessas feitas a Israel.
Estêvão também nos ensina que o conhecimento bíblico não é apenas acadêmico ou intelectual, mas essencialmente espiritual e missional. Ele compreendeu que os ataques que sofria não eram apenas pessoais, mas parte de uma resistência histórica ao próprio Deus e à sua obra redentora.
Portanto, a defesa da fé não deve ser um exercício de vaidade intelectual, mas um compromisso de exaltar a Cristo e demonstrar, por meio da Palavra, que Deus continua soberano, conduzindo a história em direção ao cumprimento dos seus propósitos eternos. Estêvão, cheio do Espírito Santo, mostra que uma fé bem fundamentada nas Escrituras é capaz de enfrentar qualquer oposição — e até a morte, se necessário — sem perder a convicção e a esperança.
O que aprendemos neste item 1? Aprendemos que toda a história de Israel só pode ser compreendida corretamente à luz da revelação de Jesus Cristo. O discurso de Estêvão (Atos 7) não é uma simples resposta legal ou teológica, mas uma pregação que insere a cruz de Cristo no centro da história da redenção. Isto nos ensina que:
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2. Corações endurecidos
Ao concluir sua defesa, Estêvão confronta diretamente seus acusadores com uma dura, porém necessária, denúncia:
“Homens de dura cerviz, incircuncisos de coração e de ouvidos, vós sempre resistis ao Espírito Santo; assim como fizeram vossos pais, também vós o fazeis” (Atos 7:51).
Aqui, ele expõe a contínua rebeldia de Israel contra Deus, alinhando seus ouvintes com a mesma teimosa resistência demonstrada pelos antepassados ao longo da história.
O termo “dura cerviz” remete a uma expressão frequentemente usada no Antigo Testamento (Êx.32:9; Dt.9:6,13) para descrever um povo teimoso, obstinado e inflexível, como um animal que recusa dobrar a nuca ao jugo. Já o termo “incircuncisos de coração e ouvidos” revela que, embora praticassem rituais externos, seus corações permaneciam impuros, surdos e insensíveis à voz de Deus — uma acusação grave que, nas palavras de John Stott, equivalia a chamá-los de “pagãos de coração”, totalmente alheios à verdadeira aliança.
Estêvão então os responsabiliza por três pecados gravíssimos:
a) Resistirem continuamente ao Espírito Santo, rejeitando seus apelos e endurecendo seus corações (Atos 7:51).
b) Perseguirem os profetas, seguindo o padrão dos seus antepassados, que mataram aqueles que anunciaram a vinda do Messias, o “Justo” (Atos 7:52).
c) Violarem a própria Lei, que receberam por ministério de anjos, mas que nunca verdadeiramente obedeceram (Atos 7:53).
Hernandes Dias Lopes, citando William Barclay, observa que, diferentemente de Pedro, que atribuiu certa ignorância ao povo no momento da crucificação (Atos 3:17), Estêvão não ameniza a gravidade da culpa dos seus ouvintes. A resistência deles não era fruto de ignorância, mas de rebelião deliberada e consciente contra Deus, sua Lei e seu Espírito.
Portanto, Estêvão deixa claro que o maior problema não era a falta de conhecimento, mas a dureza de coração — uma disposição obstinada em rejeitar tanto a revelação passada quanto a plena revelação de Deus em Cristo.
O que aprendemos neste item 2? Ao final do seu discurso, Estêvão faz um diagnóstico espiritual duro e direto: o problema central de seus ouvintes era o coração endurecido. Apesar de conhecerem a Lei e os profetas, eles resistiam ao Espírito Santo e rejeitavam a verdade revelada em Cristo. Isto nos ensina que:
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Síntese do aprendizado do Tópico II: A Igreja, ao defender sua fé, precisa mais do que argumentos bem elaborados; precisa de homens e mulheres cheios do Espírito Santo, profundamente enraizados nas Escrituras, e dispostos a proclamar com firmeza e amor que toda a história da salvação aponta para Cristo. Estêvão nos ensina que essa defesa é espiritual, corajosa e sempre confrontará os corações endurecidos — mas também será uma poderosa proclamação do evangelho, mesmo sob ameaça de morte. |
III. ESTÊVÃO, O PROTOMÁRTIR DO CRISTIANIMSO
Neste tópico III, aprenderemos lições profundas e inspiradoras para a vida cristã prática e piedosa, extraídas da trajetória e do martírio do primeiro crente a morrer por causa da fé em Jesus. Através dos três itens a seguir, somos convidados a refletir sobre o testemunho, o caráter e a postura de Estêvão diante da oposição, do sofrimento e da morte.
1. Contemplando a vitória da cruz
“Mas ele, estando cheio do Espírito Santo e fixando os olhos no céu, viu a glória de Deus e Jesus, que estava à direita de Deus, e disse: Eis que vejo os céus abertos e o Filho do Homem, que está em pé à mão direita de Deus “ (Atos 7:55,56).
Estêvão, cheio do Espírito Santo, confrontou com firmeza os líderes que haviam rejeitado e crucificado Jesus. Diante da verdade, seus acusadores, em vez de se arrependerem, reagiram com ira, cerrando os dentes e cometendo mais um crime (Atos 7:57). Sua morte não foi um julgamento formal, mas um linchamento movido por uma fúria cega e descontrolada, já que o Sinédrio não possuía autoridade legal para aplicar a pena de morte.
Em Atos 7:54-60, contemplamos os últimos momentos de Estêvão, marcados por quatro atitudes memoráveis:
· Seu último olhar foi para o céu, onde viu a glória de Deus e Jesus em pé à direita do Pai (Atos 7:55);
· Seu último testemunho foi proclamar essa visão gloriosa diante de seus algozes (Atos 7:56);
· Sua última súplica pessoal foi: “Senhor Jesus, recebe o meu espírito” (Atos 7:59);
· E sua última oração foi de perdão por seus perseguidores: “Senhor, não lhes imputes este pecado” (Atos 7:60).
Destaques importantes desse episódio:
· O segredo da coragem de Estêvão. Estêvão encarou o martírio como a sua entrada triunfal na presença de Cristo.
· Seguiu o exemplo de Jesus. Assim como Cristo, que na cruz orou pedindo perdão para os seus algozes (Lc.23:34), Estêvão também intercedeu por seus assassinos.
· A morte com paz. A violenta perseguição terminou em profunda paz. Ele adormeceu na terra e despertou nos braços do Salvador.
A igreja que mantém os olhos no Cristo glorificado não negocia sua fé, não teme a perseguição e encontra na vitória da cruz a força para perseverar. Como Estêvão e o apóstolo Paulo, que declarou estar disposto não apenas a sofrer, mas também a morrer pelo nome de Jesus (Atos 21:13), somos chamados a viver uma fé destemida, olhando firmemente para o Autor e Consumador da nossa fé (Hb.12:2).
O que aprendemos neste item 1? Aqui Estêvão nos ensina que a verdadeira vitória está na cruz de Cristo. Mesmo diante da morte, ele permaneceu cheio do Espírito Santo, olhando para o céu e contemplando a glória de Jesus. Seus últimos momentos revelam um modelo de fé e coragem:
Essas atitudes mostram que a força do cristão não está em si mesmo, mas no Cristo glorificado. A fé que olha para Jesus não teme perseguições, não negocia princípios e encontra paz até nos momentos mais difíceis. ➡️ Em resumo: Estêvão nos inspira a viver uma fé corajosa, centrada em Cristo, pronta para testemunhar e até sofrer por amor ao Evangelho, sabendo que a morte em Cristo é apenas a entrada triunfal na eternidade. |
As últimas palavras de Estêvão antes de sua morte ecoam profundamente os ensinamentos e o exemplo de Cristo na cruz:
“Senhor, não lhes imputes este pecado” (Atos 7:60).
Este não foi apenas um gesto de misericórdia, mas uma demonstração prática do amor incondicional que caracteriza o verdadeiro discípulo de Jesus. A expressão “pondo-se de joelhos” indica não apenas uma posição física, mas uma atitude de total rendição, humildade e intercessão até o seu último suspiro.
Assim como Jesus, que na cruz orou: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc.23:34), Estêvão intercede pelos seus algozes, mostrando que a essência do Evangelho não é a vingança, mas o perdão e o amor que busca a redenção até dos perseguidores.
Aqui temos o retrato de uma igreja que não carrega ódio, não busca vingança, mas se entrega em favor dos perdidos, mesmo que isso lhe custe a própria vida. É a representação viva daquilo que Jesus ensinou no Sermão do Monte: “Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem” (Mt.5:44).
Estêvão não temeu a morte porque contemplava a coroa da vida prometida aos fiéis (Ap.2:10). Seu testemunho nos ensina que perdoar os agressores não é sinal de fraqueza, mas de profunda maturidade espiritual, alinhada ao caráter de Cristo. Uma igreja que aprende a amar e a perdoar até mesmo seus perseguidores reflete o verdadeiro espírito do Reino de Deus e permanece inabalável diante das adversidades.
O que aprendemos neste item 2? Este item 2 nos ensina de forma prática e profunda o verdadeiro espírito do Evangelho. Em resumo, podemos destacar:
👉 Em termos práticos, aprendemos que perdoar não é sinal de fraqueza, mas de força espiritual. A igreja que perdoa é a igreja que vence. |
3. Devemos estar preparados para as pedradas da vida
Na caminhada cristã, todos, em algum momento, enfrentaremos as “pedradas” da vida — situações que ferem, machucam e, muitas vezes, vêm de onde menos esperamos. As pedradas podem ser: críticas, calúnias, perseguições, inveja, rejeição ou traições. E a pergunta é: Por que as pessoas atiram pedras? Muitas vezes, isso ocorre por três razões principais:
· Inveja: porque não podem ser o que você é;
· Ciúme: porque não podem ter o que você tem;
· Vingança ou frustração: porque não conseguem fazer o que você faz.
Foi exatamente isso que Estêvão enfrentou. O texto de Atos 6:8 destaca que ele era um homem “cheio de fé, de poder, que fazia prodígios e grandes sinais entre o povo”. Isso incomodou profundamente seus opositores.
Por que apedrejaram Estêvão?
· Porque não podiam ser quem ele era — um homem cheio de fé e do Espírito Santo.
· Porque não podiam ter o que ele tinha — uma sabedoria celestial e uma vida cheia da graça de Deus.
· Porque não podiam fazer o que ele fazia — operar sinais, prodígios e viver um testemunho irrepreensível.
O sucesso espiritual e o brilho da vida de Estêvão expuseram o fracasso espiritual, a hipocrisia e a resistência dos seus opositores ao Espírito Santo. Da mesma forma, até hoje, muitos não suportam ver a luz de Cristo refletida na vida dos outros, pois ela revela suas próprias trevas.
Como se preparar para as pedradas da vida? Aprendemos com Estêvão que o segredo para suportar as adversidades e ataques está em uma vida fundamentada em Deus:
a) Cheio de fé — uma fé sólida, viva, que não se abala nas adversidades (Atos 6:8).
b) Cheio do Espírito Santo — somente a presença do Espírito traz força, coragem, discernimento e paz em meio às lutas (Atos 6:8).
c) Uma vida diferenciada — seu rosto brilhava como o de um anjo, revelando uma vida que refletia a glória de Deus (Atos 6:15).
d) Conhecedor da Palavra — sua defesa magistral (Atos 7) demonstrou profundo conhecimento das Escrituras e do plano da salvação. O crente que conhece a Palavra não se deixa destruir pelas pedradas, pois sabe quem é em Deus.
e) Vida focada no céu — Estêvão suportou tudo porque seus olhos estavam no trono de Deus. Ele “olhou para o céu e viu a glória de Deus e Jesus em pé à direita de Deus” (Atos 7:55). Quem olha para o céu não se desespera com as pedradas da terra.
As pedradas da vida são inevitáveis para quem vive uma vida de integridade, fé e compromisso com Deus. Mas, assim como Estêvão, o cristão que vive cheio do Espírito, da Palavra e com os olhos na eternidade, suporta, vence e sai da prova mais fortalecido, sabendo que nenhuma pedra lançada na terra poderá tirar sua coroa no céu.
Resumo Didático deste item 3 A experiência de Estêvão nos ensina que, na vida cristã, todos enfrentarão “pedradas” — críticas, invejas, calúnias e perseguições. Essas pedras geralmente vêm porque a luz de Cristo em nós incomoda as trevas ao redor. Estêvão foi apedrejado não por fazer o mal, mas por ser um homem cheio de fé, do Espírito e de sabedoria. Da mesma forma, muitos ataques que recebemos não são contra nós, mas contra aquilo que Deus faz por meio de nós. O segredo para suportar as pedradas é estar espiritualmente preparado:
Assim, aprendemos que as pedradas não devem nos desanimar, mas nos aproximar ainda mais de Deus. O cristão fiel transforma as pedradas em degraus de crescimento espiritual, confiando que nenhuma pedra lançada contra ele pode roubar a recompensa eterna preparada pelo Senhor. 📌 Aplicação Prática Na vida da Igreja hoje, as “pedradas” não são apenas físicas, mas espirituais, emocionais e sociais. O crente pode ser alvo de zombarias, exclusões, perseguições ideológicas, críticas injustas ou até mesmo oposição dentro da própria família. Diante disso, a postura deve ser a mesma de Estêvão: não revidar com ódio, mas permanecer cheio do Espírito Santo e com os olhos fixos em Cristo.
Assim, em vez de nos deixarmos abater, transformamos as pedradas da vida em oportunidades de testemunho, mostrando que a verdadeira força do cristão não está em evitar o sofrimento, mas em permanecer firme e cheio do Espírito em meio a ele. |
Resumo didático do tópico III Este tópico nos desafia a viver uma fé autêntica, firme, amorosa e celestial. Com Estêvão, aprendemos que: · A vitória do cristão está em manter os olhos em Cristo, mesmo diante da morte; · O perdão é o maior sinal de maturidade espiritual e semelhança com Cristo; · As lutas e perseguições fazem parte da caminhada, mas não nos derrotam se estivermos cheios do Espírito, da Palavra e da esperança eterna. Assim, a vida de Estêvão não é apenas uma lembrança histórica — é um chamado atual à perseverança, ao perdão e à fidelidade até o fim. |
CONCLUSÃO
A vida e o martírio de Estêvão nos ensinam que seguir a Cristo exige coragem, convicção e disposição para enfrentar rejeição, perseguição e até o sacrifício da própria vida. Assim como ele, a Igreja precisa estar preparada para defender sua fé, enfrentar as falsas narrativas e, se necessário, sofrer por amor ao Evangelho. Estêvão é o exemplo de que quem vive com os olhos na glória não teme as pedradas da terra. Que sejamos uma Igreja que não negocia seus princípios, que não teme os desafios e que vive na plenitude do Espírito, sempre olhando para Jesus, autor e consumador da nossa fé.