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A TEOLOGIA DE ELIÚ: O SOFRIMENTO É UMA CORREÇÃO DIVINA

 

Texto Base: Jó 32:1-4; 33:1-4; 34:1-6; 36:1-5

 

 “Ao aflito livra da sua aflição e, na opressão, se revela aos seus ouvidos” (Jó 36:15).

Jó 32:

1.Então, aqueles três homens cessaram de responder a Jó; porque era justo aos seus próprios olhos.

2.E acendeu-se a ira de Eliú, filho de Baraquel, o buzita, da família de Rão; contra Jó se acendeu a sua ira, porque se justificava a si mesmo, mais do que a Deus.

3.Também a sua ira se acendeu contra os seus três amigos; porque, não achando que responder, todavia, condenavam a Jó.

4.Eliú, porém, esperou para falar a Jó, porquanto tinham mais idade do que ele.

 Jó 33:

1.Assim, na verdade, ó Jó, ouve as minhas razões e dá ouvidos a todas as minhas palavras.

2.Eis que já abri a minha boca; já falou a minha língua debaixo do meu paladar.

3.As minhas razões sairão da sinceridade do meu coração; e a pura ciência, dos meus lábios.

4.O Espírito de Deus me fez; e a inspiração do Todo-Poderoso me deu vida.

 Jó 34:

1.Respondeu mais Eliú e disse:

2.Ouvi vós, sábios, as minhas razões; e vós, instruídos, inclinai os ouvidos para mim.

3.Porque o ouvido prova as palavras como o paladar prova a comida.

4.O que é direito escolhamos para nós; e conheçamos entre nós o que é bom.

5.Porque Jó disse: Sou justo, e Deus tirou o meu direito.

6.Apesar do meu direito, sou considerado mentiroso; a minha ferida é incurável, embora eu esteja sem transgressão.

 Jó 36:

1.Prosseguiu ainda Eliú e disse:

2.Espera-me um pouco, e mostrar-te-ei que ainda há razões a favor de Deus.

3.Desde longe repetirei a minha opinião; e ao meu Criador atribuirei a justiça.

4.Porque, na verdade, as minhas palavras não serão falsas; contigo está um que é sincero na sua opinião

5.Eis que Deus é mui grande; contudo, a ninguém despreza; grande é em força de coração.

INTRODUÇÃO

Nesta Aula trataremos da teologia de Eliú, um quarto amigo de Jó; sua teologia: o sofrimento é uma ação pedagógica de Deus para corrigir o homem. Depois da réplica de Jó ao terceiro discurso de Bildade, exsurge um silêncio, pois os amigos de Jó não encontraram meios para convencer o patriarca, que seguiu convicto de sua inocência; apareceu, então, Eliú, o mais jovem dentre os quatro, cuja presença não fora até então mencionada no livro. Eliú é mencionado no livro de Jó a partir do capítulo 32, quando começou a sua fala, fala esta que não teve resposta por parte do patriarca Jó. Eliú ingressou no debate procurando ser um meio-termo entre o discurso dos amigos e o do patriarca, disto resultando uma visão de Deus mais real que a dos amigos de Jó, mas também insuficiente para desmentir a forte convicção do patriarca. Embora ainda achasse que Jó seria um pecador, Eliú conseguiu, em seu discurso, ter uma visão da graça de Deus, algo que fora completamente ignorado pelos outros amigos do patriarca, e, por isso, viu que o sofrimento pode ser resultado do amor de Deus, não apenas fruto de uma punição.

I. O SOFRIMENTO COMO UMA FORMA DE REVELAR DEUS

O primeiro discurso de Eliú foi direcionado aos outros três amigos (Jó cap.32). Durante toda a discursão, entre os três amigos e Jó, ele se manteve calado, por respeito à idade deles. Agora, porém, não consegue mais se conter. Declarou que sábios não são os de mais idade e que Deus pode conceder discernimento aos mais jovens, como ele. Repreendeu os outros amigos de Jó por não apresentarem argumentos convincentes. Por causa disso, sentiu-se compelido a falar e propôs declarar sua opinião sem usar de lisonjas ou de parcialidade (cf. Jó 32:7-22).

Em seu segundo discurso, agora direcionado a Jó, Eliú acusou o patriarca de ter sido injusto para com Deus, pois não poderia considerar o Senhor como seu inimigo em virtude do sofrimento que estava passando, ainda que fosse alguém inocente, como afirmava ser (Jó 33:8-13). Eliú afirmou que, ao considerar Deus como seu inimigo, Jó estava, indevidamente, colocando-se numa posição de superioridade em relação a Deus, pois estava julgando a Deus, o que é inadmissível ao homem. Ainda que Jó tivesse moderado, durante suas respostas a seus amigos, não restava dúvida de que considerar a Deus como seu inimigo era uma atitude inadequada que Jó tomava, não em relação a Deus, mas em relação a si próprio, uma posição que, efetivamente, não era a sua, qual seja, a de querer questionar os propósitos divinos. Não devemos contender com Deus, mas devemos nos submeter à Sua vontade, crendo que tudo que acontece é o melhor para nós (Rm.8:28).

1. Deus é soberano (Jó 33:14,15)

Em continuação ao seu segundo discurso, Eliú insiste que Deus é soberano e não tem que prestar contas do que faz para ninguém (Jó 33:13,14), mas, mesmo assim, por obra de Sua vontade apenas, ainda se dá ao trabalho de revelar ao homem o que está a fazer, quando Lhe convém fazê-lo (Jó 33:14-18). O Deus de Eliú, ao contrário dos demais amigos de Jó, é um Deus participante, um Deus que não deixa Sua criação à própria sorte, mas um Deus que não está obrigado a prestar contas, pois é Senhor e Soberano. 

“Por que razão contendes com ele? Porque ele não dá contas de nenhum dos seus feitos. Antes, Deus fala uma e duas vezes; porém ninguém atenta para isso.
Em sonho ou em visão de noite, quando cai sono profundo sobre os homens, e adormecem na cama” (Jó 33:13-15).

Vemos aqui, sem dúvida alguma, um Deus bem diferente do apregoado pelos arautos da confissão positiva e da teologia da prosperidade nos dias hodiernos. É um Deus que quer, sim, o bem do homem (Jó 33:17,18), mas que, para tanto, muitas vezes, dá ao homem coisas que, aparentemente são más, como a enfermidade (Jó 33:19-22). É um Deus que fala de muitas maneiras (Jó 33:15,16) e que não está sujeito aos caprichos humanos, um Deus cujo propósito é trazer bem ao homem, mesmo que por caminhos que ao homem sejam estranhos e incompreensíveis (Jó 33:29-33).

2. O orgulho do homem priva-o de ouvir Deus

Já afirmamos na Aula 06 que Deus é um Ser transcendente e imanente, ou seja, a despeito de habitar nas alturas mais insondáveis, e apesar de infinito e imenso, não permanece alheio às suas criaturas. Deus fala ao ser humano de várias maneiras, inclusive pelo silêncio. De acordo com Eliú, o problema não é o silêncio de Deus, mas o orgulho humano que não lhe permite escutá-lo. Eliú repreendeu Jó pela maneira com que declarou sua inocência e por culpar Deus de tratá-lo injustamente. “Deus é maior do que o homem” (Jó 33:12), declarou Eliú, e não precisa dar “contas de nenhum dos seus atos” ao ser humano (Jó 33:13). Todavia, fala com as pessoas por meio de sonhos e visões noturnas (Jó 33:14,15), para exortá-las sobre a maldade e o orgulho e para salvá-las da morte violenta (Jó 33:17,18).

Quando passamos por momentos difíceis em nossa vida, é natural querer saber o porquê disso está ocorrendo. Mas, quando olhamos para a Bíblia percebemos que homens e mulheres puderam reconhecer a voz de Deus de dentro do sofrimento. À época de Jó ninguém tinha esta percepção, nem mesmo o patriarca. Por isso, ele queria descobrir por que estava sofrendo. Nos capítulos anteriores, podemos sentir a sua frustração. Eliú disse a Jó que Deus estava tentando responder, mas ele não estava ouvindo. Foi neste ponto que Eliú julgou a Deus de forma errada. Se Deus fosse obrigado a responder todas as nossas perguntas, nós não seríamos testados de forma adequada. Imagine se Deus houvesse dito a Jó: “Jó, Satanás vai testá-lo e afligi-lo, mas ao final você será curado e receberá tudo de volta”. A provação de Jó não teria nenhum sentido. O maior teste de Jó não foi a dor, e sim o fato de não saber o motivo do seu sofrimento. Nossa maior luta pode ser a necessidade de confiarmos na bondade de Deus, mesmo não compreendendo por que a nossa vida está caminhando desta forma. Precisamos aprender a confiar em Deus, que Ele é bom, e não na bondade da vida.

3. O mistério da redenção (Jó 33:19-24)

19.Também no seu leito é castigado com dores, com incessante contenda nos seus ossos;
20.de modo que a sua vida abomina o pão, e a sua alma, a comida apetecível.

21.A sua carne, que se via, agora desaparece, e os seus ossos, que não se viam, agora se descobrem.

22.A sua alma se vai chegando à cova, e a sua vida, aos portadores da morte.

23.Se com ele houver um anjo intercessor, um dos milhares, para declarar ao homem o que lhe convém,

24.então, Deus terá misericórdia dele e dirá ao anjo: Redime-o, para que não desça à cova; achei resgate.

Além de sonhos e visões, Eliú também destaca que o Senhor também fala por meio de dores e doenças graves (Jó 33:19-22) (situações em que até mesmo a comida apetitosa se torna repulsiva). “Se [...] houver um anjo intercessor” (Jó 33:23) e este explicar os caminhos justos de Deus ao homem (e se o sofredor acolher a palavra pela fé), então o Senhor o salvará por meio de um resgate adequado, “para que não desça à cova” (Jó 33:24). Não há dúvidas de que esse intercessor/mediador é a mesma testemunha celestial que Jó pedia que defendesse a sua causa (Jó 16:19) e o redentor que o justificasse depois de sua morte (Jó 19:25). O foco de Eliú era que Deus havia falado por diversas vezes. Ele falara em sonhos e visões (Jó 33:15-18), através do sofrimento (Jó 33:19-22), e por meio de um anjo (Jó 33:23,24). Jó sabia disso. Eliú acusou Jó de não dar ouvidos a Deus, o que não era verdade.

Embora Eliú não explique o que quer dizer com “achei resgate”, no final do versículo 24, é justificável imaginar que esteja se referindo Àquele que “a si mesmo se deu em resgate por todos” (1Tm.2:6). Mesmo sem saber, Eliú está tratando aqui do mistério da Redenção que milhares de anos após haveria de ser revelado. Segundo Eliú, a pessoa que ouve a admoestação do Senhor tem a saúde física e espiritual restaurada. Aquele que confessa seu pecado é resgatado da morte espiritual e/ou física.

 II. O SOFRIMENTO COMO MEIO DE REVELAR A JUSTIÇA E A SOBERANIA DE DEUS

Neste tópico trataremos do terceiro discurso de Eliú aos três amigos de Jó (capítulo 34). Neste seu terceiro discurso, ele analisa a declaração de inocência de Jó, declaração na qual, como vimos, não acreditava, pois, apesar de sua melhor visão e amplidão em relação aos seus amigos, Eliú ainda continuava compartilhando da ideia do dogma da retribuição e cometeu, neste ponto, o mesmo erro de Elifaz, Bildade e Zofar. Para Eliú, ainda havia como discernir o que é bom e o que é mau, algo que é fruto de um julgamento que não pode ser feito pelo homem e, aqui, Eliú cometeu o mesmo erro que apontou em Jó no segundo discurso, o de se fazer juiz, algo que somente compete a Deus (cf.Tg.4:11,12).

1. A justiça de Deus demonstrada (Jó 34:1-15)

Eliú, juntamente com os demais amigos de Jó, na defesa da justiça de Deus, fez acusação contra Jó. Ele citou as declarações de Jó, em que este se queixava de Deus por causar sofrimento a um homem e por não haver vantagem em levar uma vida piedosa a fim de agradar ao Senhor. Eliú afirmou que Jó se dizia justo e que Deus lhe havia tirado o seu direito, mas não aceitava este argumento. Voltando a insistir na tese da superioridade de Deus em relação ao homem (Jó 34:12-15), disse que Jó advogava a tese de que não adiantava ser direito e que Jó era um homem que caminhava em companhia dos que praticavam a iniquidade e que andava com homens ímpios, algo que, sabemos, não corresponder à realidade (Jó 34:5-10). Eliú insistiu em que o Todo-Poderoso nunca é culpado de injustiças, pois isso contraria sua própria natureza (Jó 34:10,12). Portanto, na perspectiva de Eliú, os argumentos de Jó eram meras insolências. Aliás, “se Deus pensasse apenas em si mesmo”, afirmou Eliú, todas as suas criaturas morreriam e voltariam para o pó (Jó 34:14,15). Apesar de invocar a inspiração divina, Eliú não se desprendeu, totalmente, do dogma da retribuição e continuava, como seus outros amigos, a defender a tese de que "segundo a obra do homem, Deus lhe paga, e faz que cada um ache segundo o seu caminho" (Jó 34:11).

2. O caráter justo de Deus

Para justificar a sua tese diante de Jó e de seus demais amigos, Eliú descreveu o caráter justo de Deus da seguinte forma:

a) Ele age com justiça quando retribui ao homem o que ele merece (Jó 34.11):

“Pois retribui ao homem segundo as suas obras e faz que a cada um toque segundo o seu caminho”.

b) Deus não precisa prestar contas de seus atos a ninguém, visto que não recebeu autoridade de nenhum outro ser criado (Jó 34:13):

“Quem lhe entregou o governo da terra? Quem lhe confiou o universo?”.

c) Como o provedor da vida humana, Ele tem todo o poder de manter ou não a humanidade (Jó 34:14,15):

“Se Deus pensasse apenas em si mesmo e para si recolhesse o seu espírito e o seu sopro, toda a carne juntamente expiraria, e o homem voltaria para o pó”.

d) O Todo-Poderoso não faz acepção de pessoas, quer sejam reis, nobres ou pobres (Jó 34:16-20):

16.Se, pois, há em ti entendimento, ouve isto; inclina os ouvidos ao som das minhas palavras.
17.Acaso, governaria o que aborrecesse o direito? E quererás tu condenar aquele que é justo e poderoso?

18.Dir-se-á a um rei: Oh! Vil? Ou aos príncipes: Oh! Perversos?

19.Quanto menos àquele que não faz acepção das pessoas de príncipes, nem estima ao rico mais do que ao pobre; porque todos são obra de suas mãos.

20.De repente, morrem; à meia-noite, os povos são perturbados e passam, e os poderosos são tomados por força invisível.

e) Deus é onisciente e como tal conhece os passos e as intenções de todos os homens sem precisar inquiri-los em juízo (Jó 34:21-25):

21.Os olhos de Deus estão sobre os caminhos do homem e veem todos os seus passos.
22.Não há trevas nem sombra assaz profunda, onde se escondam os que praticam a iniquidade.
23.Pois Deus não precisa observar por muito tempo o homem antes de o fazer ir a juízo perante ele.

24.Quebranta os fortes, sem os inquirir, e põe outros em seu lugar.

25.Ele conhece, pois, as suas obras; de noite, os transtorna, e ficam moídos.

f) Ele é justo para punir os maus (Jó 34:26-30).

26.Ele os fere como a perversos, à vista de todos;

27.porque dele se desviaram, e não quiseram compreender nenhum de seus caminhos,

28.e, assim, fizeram que o clamor do pobre subisse até Deus, e este ouviu o lamento dos aflitos.

29.Se ele aquietar-se, quem o condenará? Se encobrir o rosto, quem o poderá contemplar, seja um povo, seja um homem?

30.Para que o ímpio não reine, e não haja quem iluda o povo.

Diante desta descrição, Eliú entendeu ser uma ousadia inadmissível Jó querer contender com Deus, diante da superioridade e da soberania do Senhor (Jó 34:16-22), e entendia que, diante de Deus, ao contrário do que alegava Jó, o homem não terá qualquer chance num julgamento (Jó 34:23-32); esta visão de Eliú despreza a graça de Deus, e que não corresponde à realidade do caráter do Senhor, mas que, dentro da argumentação de Eliú, fica extremamente enfraquecida, já que Deus não é um ser distante e que não se importa com o homem. Não é sem razão que alguns comentadores bíblicos entendem que Eliú, ao tentar estabelecer um meio-termo entre as visões dos demais contendores, acaba produzindo um discurso incapaz de superar o impasse.

Dentro deste seu raciocínio, Eliú encerra o terceiro discurso dizendo que Jó, ao querer contender com Deus e a dizer que o Senhor se fez seu inimigo sem razão, cometeu um pecado além dos pecados pelos quais estava sofrendo: o pecado de se rebelar contra Deus. Por isso, diz Eliú, Jó deve ser, mesmo, provado até o fim, pois é um homem mau, pecador, pois se rebelou contra o Senhor (Jó 34:34-37). Todavia, bem sabemos que tais argumentos de Eliú não têm qualquer respaldo, pois, se é certo que Jó foi imprudente em amaldiçoar o dia de seu nascimento, como também em achar que Deus tornara-se seu inimigo, não é menos verdadeiro que era um homem inocente, sem culpa e, portanto, podia, sim, declarar-se inocente.

3. A defesa da soberania de Deus

Eliú encerrou o capítulo 34 mostrando a Jó que Deus, em sua soberania e livre vontade, não tem a obrigação de agir segundo o querer do homem. Disse Eliú:

“Acaso, deve ele recompensar-te segundo tu queres ou não queres? Acaso, deve ele dizer-te: Escolhe tu, e não eu; declara o que sabes, fala? (Jó 34:33).

A soberania de Deus é uma autoridade inquestionável que o Senhor detém sobre o Universo, pelo fato óbvio de que Ele é o Criador de todas as coisas (Is.44:6;45:6; Ap.11:17). Por ser soberano, Deus sabe o que é o bem e, por isso, como nenhum outro ser, tem condições de permitir, na vida dos homens, ocasiões e circunstâncias que, aparentemente más, contribuem para o bem dos indivíduos.

O Deus soberano jamais permitirá que soframos sem um santo propósito. Deus não desperdiça sofrimento na vida de seus filhos. Para cada lágrima que rola em nossa face, Deus tem um consolo; para cada prova, uma providência libertadora. Se as provações têm diferentes tonalidades para nos afligir, também a graça de Deus tem diferentes tons para nos consolar.

Embora Eliú não acreditasse, Jó tinha plena convicção de que Deus é soberano para tomar os filhos conforme o seu perfeito propósito. Não importa se os agentes que ceifam a vida dos filhos são perversos; só Deus tem o poder de dar a vida e de tirá-la. Até mesmo nas maiores tragédias é Deus quem está no controle. Até mesmo quando Satanás está agindo, é a mão da providência de Deus que está governando. Mesmo que a providência seja carrancuda, é a face benevolente de Deus que está voltada para nós. Os dramas da nossa vida não apanham Deus de surpresa nem desafiam sua providência. Mesmo quando cruzamos os vales mais escuros, é a mão de Deus que dirige o nosso destino.

 III. O SOFRIMENTO COMO UM INSTRUMENTO PEDAGÓGICO DE DEUS 

Trataremos aqui do quarto discurso de Eliú (Jó 36:1-33). Ele apresentou uma análise da suposta afirmação de Jó de que ele era mais justo do que Deus. Jó, efetivamente, não afirmara ser mais justo do que Deus, mas queria que Deus lhe explicasse porque estava sofrendo daquela maneira se era inocente. Mas, para Eliú, Jó estava querendo ser mais justo do que Deus e, para tanto, procurou demonstrar a grandeza de Deus em relação ao homem.

1. O caráter pedagógico do sofrimento (Jó 36:7-15)

No seu discurso, Eliú recrimina a visão deísta dos seus amigos, motivo por que também se dirige contra eles (Jó 35:4). Diz que Deus, embora seja superior ao homem e por isso Jó não poderia com Ele contender, nem por isso é um Deus distante ou inacessível, como defenderam Elifaz, Bildade e Zofar (Jó 35:5-16), mas um Deus participante, que não despreza o homem (Jó 36:5), um Deus que não é só um ser grande, mas que também tem um grande coração (Jó 36:5), um Deus que Se compadece dos justos e que ver tanto os ímpios quanto os justos (Jó 36:6-12). É um Deus participante, um Deus que fala, um Deus que se interessa pelo homem, mas, ainda, um Deus que fará bem aos que merecerem e mal aos que transgredirem. 

Deus, na visão de Eliú, é um Deus que livra o aflito da aflição (Jó 36:15), mas continua sendo um Deus que castiga inevitavelmente o ímpio e o hipócrita, inclusive fazendo-o morrer precocemente, ainda na mocidade (Jó 36:13-16). Apesar de vislumbrar compaixão, graça e amor em Deus, Eliú ainda não conseguia ver a possibilidade de um justo sofrer para seu aprimoramento espiritual e, portanto, entendia que Jó tinha sido orgulhoso, presunçoso e que, por isso, estava sofrendo (Jó 36:17-19). Para Eliú, antes de desejar a morte, Jó deveria arrepender-se para obter o favor de Deus, o qual não estava distante e que estava pronto a perdoar (Jó 36:20-33). 

Embora compreendesse que, durante sua provação, Jó se comportava de forma pecaminosa, Eliú introduziu a ideia de que o sofrimento tem um caráter pedagógico (Jó 36:15) - “Ao aflito livra da sua aflição e, na opressão, se revela aos seus ouvidos”. Nosso sofrimento é sempre pedagógico, tem sempre um fim proveitoso. Os justos aprendem com o sofrimento. Quando passamos pelo vale da dor, precisamos olhar para a majestade de Deus, e não para a profundidade das nossas feridas. Se olharmos para nós, entraremos em pânico; se olharmos para Deus, sentiremos paz no vale. Se observarmos os ventos contrários e o rugido da tempestade, naufragaremos; mas, se fixarmos os olhos em Cristo, caminharemos sobre as ondas revoltas.

2. Adorando a Deus na tormenta

“Eis que Deus é grande, e nós o não compreendemos, e o número dos seus anos não se pode calcular” (Jó 36:26).

Ao afirmar a Jó que não há como querer compreender a Deus (Jó 36:26), Eliú adiantou uma parte do discurso que o próprio Deus faria ao Se dirigir ao patriarca, pois, neste ponto, Eliú estava correto. Jó não deveria contender com Deus, mas submeter-se a Ele sem reclamações ou queixas, sabendo, por conhecê-lo bem, que aquilo era o melhor que lhe podia acontecer na sua vida de comunhão com Deus.

Num longo discurso, Eliú apresentou as maravilhosas obras de Deus em três estações do ano (outono - Jó 36:26-37:5; inverno - Jó 37:6-13; verão - Jó 37:14-22), a fim de demonstrar que Deus está muito acima da compreensão humana (Jó 37:23). Eliú investigou vários aspectos da natureza para demonstrar o poder, a sabedoria e a majestade de Deus. É impressionante sua descrição sobre as manifestações da natureza por meio de tempestades, neve, aguaceiro, ventos do Norte, frio e densas nuvens (cf. Jó 37:1-13).

Assim, dentro de sua sabedoria (cf. Jó 37:24), Eliú acabou por concluir que, mesmo crendo que Jó fosse um pecador, e por isso estava sofrendo, Deus era muito superior aos homens e, por isso, não deveriam estar discutindo ou contendendo com Deus acerca do que estava se passando. Somente Deus poderia discutir a questão e, como que aprovando esta conclusão do jovem e sábio Eliú, será o próprio Deus, em pessoa, que desatará a perplexidade e a incompreensão que toma conta dos debatedores, inclusive do patriarca Jó, interrompendo o debate. Portanto, a majestade e o poder de Deus excedem nossa frágil compreensão. Por isso, é melhor temer ao Senhor e nos sujeitarmos à sua disciplina. Como bem ensinou Eliú, a adoração e a murmuração não podem coexistir, são atitudes excludentes. Por isso, ele foi tão decisivo com Jó, que por um lado magnificava a majestade de Deus, mas por outro murmurava contra Ele.

Nesse seu discurso final, Eliú ensinou que Deus tem interesse no homem e, por isso, para seu aprimoramento, prova-nos e permite o nosso sofrimento, sofrimento esse que não vem apenas como punição, mas também como disciplina, como fonte de aperfeiçoamento; logo, não devemos deixar de adorá-lo na tormenta; esta é uma das principais lições do discurso de Eliú.

Eliú termina seu discurso propondo um apelo direto: “Inclina, Jó, os ouvidos a isso, para e considera as maravilhas de Deus” (Jó 37:14). Em seguida, prossegue desafiando o conhecimento de Jó sobre a natureza: o equilíbrio das nuvens e como as vestes o aquecem quando sopra o vento sul (Jó 37:16,17). Trata-se de perguntas semelhantes aos questionamentos muito mais desafiadores que o próprio Criador apresentará a Jó nos próximos capítulos do Livro - Jó 38:1 – 42:2.

CONCLUSÃO

O Senhor conduziu Jó através das mais difíceis e inimagináveis provas, a fim de que ele viesse a tornar-se um instrumento ainda mais valioso e útil para Ele. Deus educava Jó por intermédio do sofrimento, e o mesmo pode acontecer conosco. Assim como ocorreu com Jó, o sofrimento na vida do cristão deve ser interpretado como um meio pedagógico - ele serve para esmagar a soberba humana, polir o caráter do crente, prover crescimento e maturidade espiritual. Não por acaso o apóstolo Paulo pôde dizer: "Sei estar abatido e sei também ter abundância; em toda a maneira e em todas as coisas, estou instruído, tanto a ter fartura como a ter fome, tanto a ter abundância como a padecer necessidade. Posso todas as coisas naquele que me fortalece" (Fp.4:12,13). Esse é o caminho que o Senhor nosso Deus quer que atinjamos: ser experimentados, amadurecidos e experientes. Que ouçamos a voz de Deus no sofrimento; então, poderemos dizer com convicção: "Posso tudo naquele que me fortalece".