Texto Base: Efésios 2:11,12; Romanos 4:12-14
“Portanto, lembrai-vos de que vós, noutro tempo, éreis gentios na carne e chamados incircuncisão pelos que, na carne, se chamam circuncisão feita pela mão dos homens” (Ef.2:11).
Efésios 2:
11.Portanto, lembrai-vos de que vós, noutro tempo, éreis gentios na carne e chamados incircuncisão pelos que, na carne, se chamam circuncisão feita pela mão dos homens;
12.que, naquele tempo, estáveis sem Cristo, separados da comunidade de Israel e estranhos aos concertos da promessa, não tendo esperança e sem Deus no mundo.
Romanos 4:
12.e fosse pai da circuncisão, daqueles que não somente são da circuncisão, mas que também andam nas pisadas daquela fé de Abraão, nosso pai, que tivera na incircuncisão.
13.Porque a promessa de que havia de ser herdeiro do mundo não foi feita pela lei a Abraão ou à sua posteridade, mas pela justiça da fé.
14.Pois, se os que são da lei são herdeiros, logo a fé é vã e a promessa é aniquilada.
INTRODUÇÃO
Nesta Aula trataremos da “condição dos gentios sem Deus”. Na Aula anterior aprendemos que o ser humano sem Deus estava morto (Ef.2:1-3), mas o grande amor de Deus deu nova vida a homens e mulheres. Nesta Aula, aprenderemos que o propósito de Deus vai além do indivíduo, mostrando que implica também trazer pessoas, seja qual for a etnia ou origem, para ser da “família de Deus” (Ef.2:19). E para que isso acontecesse, uma grande transformação teria que ser feita na situação dos gentios.
Os textos de Efésios 2:11 e Efésios 2:13 são marcados, respectivamente, pelas palavras “noutro tempo” e “agora”, para mostrar a situação dos gentios antes e depois da conversão a Cristo. Antes, sem Cristo, os gentios estavam longe de Deus, separados de Israel, alienados quanto à promessa, sem esperança e sem Deus no mundo; agora, foram aproximados (Ef.2:13). O preço dessa reconciliação foi “o sangue de Cristo” (Ef.2:13). A parede de separação ruiu e um novo povo nasceu: a Igreja de Jesus Cristo.
I. CHAMADOS INCIRCUNCISÃO
“Portanto, lembrai-vos de que vós, noutro tempo, éreis gentios na carne e chamados incircuncisão pelos que, na carne, se chamam circuncisão feita pela mão dos homens” (Ef.2:11).
1. O Conceito de Circuncisão
A Circuncisão é uma pequena cirurgia feita no prepúcio de todos os meninos judeus. Quando o menino judeu tem oito dias de vida, é realizada uma cerimônia onde se retira um pequeno pedaço de pele, chamado prepúcio, do órgão genital masculino. Esse procedimento não causa danos físicos (em alguns casos é até bom para a saúde), mas serve como sinal que a criança pertence a um povo diferente do povo gentio. Fica sempre uma marca no seu corpo para lhe lembrar disso (Gn.17:12-13).
Deus estabeleceu a circuncisão quando fez Seu concerto com Abraão (Gn.17:10); era um sinal estabelecido por Deus a Abraão e os seus descendentes, o povo judeu – “E circuncidareis a carne do vosso prepúcio; e isto será por sinal do concerto entre mim e vós” (Gn.17:11). Era um sinal que a pessoa era descendente de Abraão e também fazia parte do Concerto (Gn.17:9-11). Quem não era circuncidado era tido como “incircunciso” e, portanto, excluído do concerto.
Só os homens eram circuncidados, porque o homem era considerado o líder espiritual de sua família. Quem era circuncidado tinha a responsabilidade de obedecer a Deus e ensinar seus filhos a obedecer (Dt.6:6-7).
2. O significado religioso da circuncisão
O significado religioso da circuncisão apontava para separação do pecado e exclusividade para Deus. Era um indicativo tangível de que os israelitas aceitaram o concerto com Deus e de ter o próprio Deus como Senhor deles. Era um sinal de justiça que tinham mediante a fé (Gn.15:6; Rm.4:11) – “E recebeu o sinal da circuncisão, selo da justiça da fé...”.
Por meio deste sinal o povo judeu se lembraria das promessas que Deus lhe dera, e das suas próprias obrigações pessoais ante o concerto (Ex.17:14) – “E o macho com prepúcio, cuja carne do prepúcio não estiver circuncidada, aquela alma será extirpada dos seus povos; quebrantou o meu concerto”.
Só que com o passar do tempo, os judeus valorizaram demasiadamente a circuncisão em detrimento do seu valor espiritual. A circuncisão havia sido dada por Deus a Abraão como o sinal externo de que a pessoa pertencia ao povo da Aliança. Mas, tanto o ritual físico quanto a palavra circuncisão, haviam assumido uma importância exagerada. Eles se apegaram tanto ao valor externo do sinal que dividiram o mundo em duas partes: os judeus (circuncisos) e os não judeus (incircuncisos).
A circuncisão havia sido dada por Deus a Abraão como o sinal externo de que a pessoa pertencia ao povo da aliança, mas tanto o ritual físico quanto a palavra haviam assumido uma importância exagerada. Com escárnio, chamavam os não judeus de “incircuncisos”, ou seja, que eles não traziam na sua carne o sinal físico que distinguia os israelitas como o povo com quem Deus fizera uma aliança. Era tão sério que os judeus se recusavam até mesmo a comer com os “incircuncisos” (cf. Atos 11:3)
Segundo William Macdonald, os termos “incircunciso” e “incircuncisão” eram termos de desprezo étnico semelhante àqueles usados hoje em dia para se referir a nacionalidades que as pessoas menosprezam. A força dessa palavra pode ser sentida na frase dita por Davi sobre o gigante Golias: “Quem é, pois, esse incircunciso filisteu, para afrontar os exércitos do Deus vivo?” (1Sm.17:26).
Separação do pecado, exclusividade para Deus, sim; porém, desprezar as pessoas e exclui-las por causa de sua religião ou de um ritual que caracteriza esse povo, não é um procedimento coerente com o do povo que se diz ser de Deus; e Deus não aceita este tipo de comportamento, pois Ele quer que todos os povos reconciliem-se com Ele e aceitam a verdade, que é Cristo - “que quer que todos os homens se salvem e venham ao conhecimento da verdade. Porque há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo, homem, o qual se deu a si mesmo em preço de redenção por todos, para servir de testemunho a seu tempo” (1Tm2:4-6).
3. A circuncisão do coração
Em contraste com os “incircuncisos” os judeus chamavam-se de os “circuncisos”. Tinham muito orgulho desse nome, pois os identificava como um povo separado de todas as demais nações da terra.
Para os judeus, os gentios eram “cães incircuncisos”. O mais triste é que os judeus se fiavam na marca física, em vez de depositarem sua fé na realidade espiritual que esse sinal representava (Dt.10:16; Jr.9:26; Ez.44:9). Paulo critica essa ostentação dizendo que a circuncisão dos judeus era feita “na carne, por mãos humanas”, sendo meramente física. Embora tivessem o sinal externo da aliança do povo de Deus, não possuíam a realidade interna de uma verdadeira fé no Senhor - “Porque não é judeu o que o é exteriormente, nem é circuncisão a que o é exteriormente na carne. Mas é judeu o que o é no interior, e circuncisão, a que é do coração, no espírito, não na letra, cujo louvor não provém dos homens, mas de Deus” (Rm.2:28,29).
O verdadeiro judeu era aquele que possuía uma experiência espiritual interior no coração, não apenas uma cirurgia física exterior. A circuncisão que vale não é a do prepúcio externo, mas a circuncisão do coração.
Já no Pentateuco, ou seja, na própria lei de Moisés, o Senhor revelara a Israel que a circuncisão mais importante, a circuncisão que se buscava não era a retirada do prepúcio (ou seja, da pele que reveste o órgão genital masculino) do menino de oito dias, mas, antes de tudo, um pacto, uma aliança que se estabelecesse entre Deus e o homem, no qual o homem abria mão do seu poder de vontade (o órgão genital masculino simboliza a virilidade do homem, ou seja, a sua força, o seu poder, a sua capacidade, o seu “ego”), para passar a fazer a vontade de Deus, para assumir um compromisso de servir e de agradar a Deus dali para a frente, de ser um membro do povo do Senhor, da nação santa, do sacerdócio real, da geração eleita do Senhor.
Não é por outro motivo que Moisés exortou o povo a que “circuncidasse o prepúcio do seu coração e não endurecesse a sua cerviz” (Dt.10:16), bem como deixou a promessa ao povo de Israel de que Deus “circundaria o seu coração e o coração de sua semente para que amassem ao Senhor seu Deus de todo o coração e com toda a sua alma, para que vivessem” (Dt.30:6).
Pelo que podemos observar, na própria lei de Moisés, a circuncisão é apresentada como um pacto de obediência, amor e adoração a Deus. Paulo lembra os colossenses de que, a partir do momento em que eles haviam aceitado a Cristo e passado a obedecê-lo, o que significa amá-lo, pois quem ama a Jesus cumpre os Seus mandamentos (Jo.15:10,14), eles já estavam circuncidados e, o que é mais importante, com a circuncisão desejada por Deus, com uma circuncisão plena e permanente, uma circuncisão que não era apenas física, mas espiritual, a circuncisão que havia sido anunciada e pregada pelo profeta Jeremias a um povo que, embora circunciso fisicamente, estava muitíssimo distante da vontade do Senhor (Jr.4:4).
Os judeus sentiam-se seguros acerca da sua salvação por causa da circuncisão. Acreditavam, e penso que ainda acreditam, que “o homem circuncidado não vai para o inferno”, e que “a circuncisão livrará Israel do inferno”. Até mesmo no princípio da Igreja, os cristãos vindos do judaísmo acreditavam nesta questão (cf. Atos 15:1) – “Então, alguns que tinham descido da Judéia ensinavam assim os irmãos: Se vos não circuncidardes, conforme o uso de Moisés, não podeis salvar-vos”.
De igual modo, muitos crentes hoje podem argumentar que são especiais porque possuem a Bíblia, frequentam uma igreja, foram batizados e participam da Ceia do Senhor. O verdadeiro cristão, porém, não é uma pessoa que meramente se submete a certos ritos, mas alguém que adotou esses ritos porque crê que foram estabelecidos pelo Senhor e deseja desta forma expressar-lhe amor e devotamento, buscando o louvor que procede não dos homens, mas de Deus.
4. A circuncisão na Nova Aliança
O povo de Deus da Nova Aliança deve ser circuncidado? Não. O cristão não deve ser circuncidado. Jesus nunca ordenou a circuncisão. Mesmo no Velho Testamento a circuncisão era apenas um sinal exterior, que nunca salvou ninguém. A circuncisão não tinha significado algum se a pessoa não obedecesse a Deus (Rm.2:25) – “Porque a circuncisão é, na verdade, proveitosa, se tu guardares a lei; mas, se tu és transgressor da lei, a tua circuncisão se torna em incircuncisão”.
No início da Igreja houve muito debate se os cristãos deviam ser circuncidados. Os judeus que se tinham convertido achavam que sim, mas os que não eram judeus achavam que não (Atos 15:1,2). Os apóstolos discutiram sobre o assunto e chegaram ao consenso que a circuncisão não era necessária (Atos 15:19,20).
A Bíblia explica que o mais importante é a “circuncisão do coração”. Deus se preocupa com o interior, não com cerimônias exteriores. Quem tem o coração marcado pela presença de Jesus Cristo faz parte da Nova Aliança e é verdadeiramente circunciso (Fp.3:3). A aparência exterior não afeta o interior, mas o interior afeta a vida toda. Por isso o cristão não precisa nem deve se circuncidar.
Na Igreja de Colossos, havia um grupo de crentes, convertidos do judaísmo, que insistiam que os novos crentes teriam que circuncidar-se. Os judaizantes defendiam que os crentes gentios, assim que aceitassem a Cristo, deveriam se circuncidar, para, desta forma, passar a ser parte da descendência de Abraão, pois, na dispensação da lei, era assim que deveria proceder quem aceitasse o Deus de Israel, tanto que não poderia participar da páscoa o estrangeiro que não tivesse, antes, se circuncidado (Ex.12:44,48). Em assim fazendo, os judaizantes estavam anulando o valor do sacrifício de Cristo para que o homem entrasse em comunhão com Deus, porquanto ensinavam que somente através da circuncisão alguém poderia passar a fazer parte do povo de Deus, da Igreja, como se o ritual da circuncisão física fosse uma necessidade para que alguém viesse a ser salvo.
Paulo teve que intervir neste caso da igreja em Colossos. Ao indicar a posição espiritual dos crentes em Cristo, aproveitando a ocasião para também desmentir os judaizantes, afirmou que o crente que está em Jesus, que se submete a Jesus, além de ser perfeito em Cristo, também foi circuncidado, não num ritual de circuncisão física, como a que foi instituída por Deus a Abraão e a seus descendentes biológicos, mas uma circuncisão de Cristo (Cl.2:11) – “no qual também estais circuncidados com a circuncisão não feita por mão no despojo do corpo da carne: a circuncisão de Cristo”.
O problema daqueles que entendem que o crente está ainda debaixo da lei de Moisés é exatamente este: negam a suficiência do sacrifício de Cristo na cruz do Calvário para a salvação do homem e entendem que o homem, para ser salvo, além de aceitar a Cristo, deve, também, cumprir a lei. Ora, como bem nos mostra a Bíblia Sagrada, nenhum homem jamais conseguiu cumprir a lei, com exceção de Jesus Cristo e, portanto, quem recorre à lei para se salvar lança sobre si uma maldição, pois, pela lei, jamais alcançará a salvação (cf. Gl.2:21, 4:1-20).
O crente, quando aceita a Cristo, faz um pacto com o Senhor, passa da morte para a vida (João 5:24), pois estava separado de Deus por causa dos pecados, mas, pelo sangue de Cristo, agora chega perto do Senhor (Ef.2:13-16), sem que, para tanto, fosse preciso seguir a lei de Moisés, uma vez que a lei foi integralmente cumprida pelo Senhor (Mt.5:17).
Cumprida a finalidade da lei, que era tão somente a de indicar Cristo (Gl.3:24), não temos porque nos preocuparmos em querer cumpri-la, visto que, agora, em Cristo, já estamos circuncidados, ou seja, já fazemos parte integrante do Corpo de Cristo, da Sua Igreja, do povo de Deus e, como tal, estamos em comunhão com Deus, aguardando a vinda do Senhor para que nos leve a um lugar onde sempre moraremos com Ele (João 14:1-3). Veja que linda exortação de Paulo aos crentes de gálatas:
“Porque, em Cristo Jesus, nem a circuncisão nem a incircuncisão têm virtude alguma, mas sim o ser uma nova criatura” (Gl.6:15).
II. ESTRANHOS AO CONCERTO DA PROMESSA
“Que, naquele tempo, estáveis sem Cristo, separados da comunidade de Israel e estranhos aos concertos da promessa, não tendo esperança e sem Deus no mundo” (Ef.2:12).
Em Efésios 2:1-3 Paulo já havia descrito a terrível condição espiritual dos gentios, mostrando que eles eram escravos da carne, do mundo e do diabo. Agora, Paulo resume essa falência espiritual deles em cinco frases descritivas e negativas: eles estavam sem Cristo; eles estavam separados da comunidade de Israel; eles eram estranhos às alianças da promessa; eles não tinham esperança; e viviam sem Deus no mundo.
1. Uma vida sem Cristo (Ef.2:12)
“Que, naquele tempo, estáveis sem Cristo...”. Uma vida sem Cristo é o contrário de “estar em Cristo” (Ef.2:5). Os gentios estavam espiritualmente alienados, falidos espiritualmente; estavam sem Cristo, longe das bênçãos espirituais tratadas na Aula 02 (Ef.1:3).
Os gentios estavam separados de Cristo, sem nenhuma relação com o Messias prometido. Enquanto os judeus aguardavam o Messias, os gentios não o aguardavam nem sabiam nada sobre Ele. Os efésios adoravam o ídolo Diana em vez de adorar a Cristo. Eles viviam imersos numa imensa escuridão espiritual. Assim eram todos os gentios, e assim são todos os que ainda não receberam o Messias, o Senhor e Salvador Jesus Cristo.
2. Separados da Comunidade de Israel (Ef.2:12)
“...separados da comunidade de Israel...”. A comunidade de Israel era o ambiente no qual Deus se manifestava e se tornava conhecido. Os gentios estavam fora do círculo daqueles que adoravam o Deus verdadeiro. Deus havia chamado a Israel e lhe dado sua lei e suas bênçãos, mas os gentios estavam fora. A única maneira de um gentio desfrutar dessas bênçãos era se fazer um prosélito.
A Bíblia deixa muito claro que a vontade de Deus sempre foi que os estrangeiros participassem das bênçãos da salvação (Gn.22:18; Êx.12:49; Lv.19:34; 1Reis 8:41-43; Ed.6:21; Salmo 72:8-17; Is.54:2,3; 56:3-8; 60:1-3; Jr.39:15-18; Joel 2:28-32; Amós 9:11,12; Zc.8:23; Ml.1:11). É verdade que algumas vezes havia resistência por parte de alguns à chegada de prosélitos; alguns judeus de fato não apreciavam muito o trabalho missionário; o profeta Jonas parece ter sido um desses, ou pelo menos se comportou como um, mas Deus o repreendeu por isso.
Por outro lado, o próprio Antigo Testamento registra histórias de prosélitos que foram muito fiéis a Deus; dois dos exemplos mais conhecidos são as histórias de Raabe e Rute. Raabe era uma cananita que habitava em Jericó; já Rute era uma moabita. Essas duas mulheres foram recebidas na comunidade judaica, e pela vontade soberana de Deus tiveram participação importante na história da redenção. Tanto Raabe quanto Rute são citadas na genealogia de Jesus.
Posteriormente, no período interbíblico e no tempo do Novo Testamento, o número de prosélitos cresceu ainda mais. Isso também teve a ver com o contexto geopolítico daquela época. Nesse tempo a Bíblia Judaica (Antigo Testamento) foi traduzida para o idioma grego, as sinagogas foram abertas ao público e, consequentemente, muitos gentios abandonaram suas práticas pagãs e se converteram ao Deus de Israel.
A atividade missionária dos judeus em busca de prosélitos era algo comum à época de Jesus. Inclusive, certa vez Jesus repreendeu os escribas e fariseus que dispensavam muitos esforços para a conversão de um prosélito e faziam dele um “filho do inferno” (Mt.23:15). Com isso, Jesus não estava se posicionando contra os prosélitos; Ele simplesmente estava dizendo que os religiosos judeus, que tinham distorcido a verdadeira religião com conceitos humanos, faziam mais mal do que bem aos prosélitos, pois os contaminavam com uma religiosidade hipócrita e uma doutrina de salvação pelas obras.
3. Alienados aos pactos das promessas (Ef.2:12)
“... estranhos aos concertos da promessa...”. As promessas feitas a Abraão não tinham alcançado os gentios. Eles eram estranhos às alianças. Essas alianças foram os acordos relativos à promessa do Messias, feitas a Abraão e aos seus descendentes. E foi pela fé nessa promessa que os santos da Antiga Aliança obtiveram a salvação. Os gentios eram estranhos e estrangeiros; não havia alianças com eles; não estavam debaixo do pacto que tinha sido feito com Israel (Rm.9:4). Mas, depois que Cristo morreu na Cruz do calvário, tudo mudou para os que não eram judeus.
Como bem diz o Pr. Douglas Baptista, “hoje, após a revelação contida na Nova Aliança, sabemos que os gentios também estavam inclusos na promessa no plano divino (Gl.3:29). Isso, porém, só seria possível por meio de Cristo (Gl.3:14-16), de modo que, antes de Cristo e da revelação do mistério oculto (Cl.1:26,27), os gentios estavam excluídos das alianças. De qualquer maneira, Paulo ratifica que, no exclusivismo judaico, os gentios não estavam incluídos no “pacto abraâmico” e revela que a inclusão somente foi possível pela obra de Cristo (Ef.2:13-19). A fim de ressaltar essa perspectiva de alienação gentílica em relação aos pactos e às promessas, transcrevo abaixo a explanação de Francis Foulkes, na sua obra ‘Efésios -Introdução e Comentário’:
‘A promessa para os judeus, a promessa do Messias, estava envolvida nas alianças com Abraão e os patriarcas (Gn.17:1-4; 26:24; 28:13-15), e com a nação sob Moisés (Êx.24:1-11). As alianças trouxeram Israel a uma relação especial de graça com Deus, e assim à esperança de uma libertação e glória futura que seria deles. Mas até este ponto, os gentios não tinham sido incluídos nestas alianças. De maneira que permaneciam como um povo sem esperança’”.
“Diante desse quadro, os gentios não estavam apenas privados das promessas divinamente conferidas a Israel, como também não possuíam qualquer tipo de esperança. Os gentios sequer tinham noção dos pactos e das suas promessas e, por conseguinte, estavam desassistidos de qualquer promessa ou esperança. E aqui é revelada outra vez a grandeza do amor divino. Esses alienados gentios, pelo sangue de Cristo, foram inseridos nos pactos e tornaram-se herdeiros da promessa: ‘E, se sois de Cristo, então, sois descendência de Abraão e herdeiros conforme a promessa’ (Gl.3:29). Aleluia!” (Douglas Baptista).
III. SEM ESPERANÇA E SEM DEUS
“...não tendo esperança e sem Deus no mundo” (Ef.2:12. Esta era, sem dúvida, uma descrição desanimadora para os gentios.
1. Desprovidos de esperança
Antes de Cristo, não havia esperança de que os gentios encontrassem o único e verdadeiro Deus ou conseguissem qualquer coisa além da vida física neste mundo. Com bem diz o Rev. Hernandes Dias Lopes, os gentios não tinham esperança de uma vitória sobre a morte, como agora, depois que Cristo veio morrer por todos nós, temos (1Ts.4:13-18).
O futuro dos gentios era como uma noite sem estrelas. O mundo gentio entregava-se ao prazer exagerado, ora por não crer na eternidade (por exemplo, os epicureus), ora por viver esmagado pelo fatalismo (por exemplo, os estoicos). Portanto, as teorias dos filósofos pagãos sobre a vida após a morte eram, na melhor das hipóteses, vagas e não forneciam uma maneira de reparar o mal cometido durante a vida de uma pessoa. Eles não tinham “promessa divina” e, dessa maneira, nenhuma base para ter esperança.
Agora, temos esperança, e esta esperança está acima da normalidade da esperança dos seres humanos e até mesmo do povo da Antiga Aliança que ainda não conheceu Jesus como o verdadeiro Messias.
A nossa esperança é transcendental, pois ultrapassa o limite da experiência. Em 1Pedro 1:3-4 está escrito: “bendito seja o Deus e pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, segundo a sua grande misericórdia, nos gerou de novo para uma viva esperança, pela ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, para uma herança incorruptível, incontaminável e que se não pode murchar, guardada nos céus para vós”. Aqui, Pedro quis dizer que: além de termos esperança de dias melhores; além de termos esperança de que Deus vai responder nossas orações; além de termos esperança de que Deus vai abrir portas em vários setores da vida, em várias questões da vida; nós temos a esperança que um dia, todo o sofrimento, toda dor, todo mal, vai ser debelado para sempre, e sempre e sempre.
Portanto, a nossa esperança é superlativa. O salmista foi enfático quando disse: “agora, pois, Senhor, que espero eu? A minha esperança está em ti” (Sl.39:7); “Ó minha alma, espera silenciosa somente em Deus, porque dele vem a minha esperança”(Sl.62:5).
Isaias sabia muito bem o que significava esperar no Senhor, por isso disse: ”mas os que esperam no Senhor renovarão as suas forças; subirão com asas como águias; correrão, e não se cansarão; andarão, e não se fatigarão”(Is.40:31).
Paulo disse perante o governador Félix: “tendo esperança em Deus, como estes mesmos também esperam, de que há de haver ressurreição tanto dos justos como dos injustos”. Paulo quis enfatizar que um dia todos nós morreremos, caso o Senhor Jesus não venha antes disso, mas temos a esperança que ressuscitaremos e viveremos com Ele para sempre; é sem dúvida a nossa mais sublime esperança; uma condição espetacular que antes nós não tínhamos.
2. Sem Deus no mundo
“... e sem Deus no mundo” (Ef.2:12). Sem o Deus vivo, o mundo era tudo o que os gentios tinham. O Rev. Hernandes Dias Lopes afirma corretamente que quem não tem Deus não tem esperança. Embora Paulo tenha usado a palavra grega atheoi (ateu), não devemos concluir que os gentios eram ateus, pois eles tinham muitos deuses de pau e pedra (cf. Atos 17:16-23; 1Co.8:5), mas não conheciam o Deus vivo, único e verdadeiro, nem tinham relação alguma com Ele (1Co.8:4-6). Seus falsos e imaginários deuses eram vingativos e caprichosos. Eles viviam sob o tacão das ameaças e debaixo da ditadura do medo. Eles não conheciam o Deus Criador, Sustentador, Redentor e Consolador. Estavam assim sem Deus num mundo onde não havia Deus algum.
Olhar para o futuro sem esperança já é algo terrível, mas não ter no coração a fé em Deus é inexprimivelmente trágico. Assim era o mundo gentílico: sem Cristo, separados da comunidade da Israel e estranhos às alianças da promessa, não tendo esperança e sem Deus no mundo (Ef.2:12). Nós estávamos nessa mesma condição; mantínhamos inimizade com Deus e não fazíamos parte dessa nova sociedade, a Igreja de Cristo.
3. “Mas, agora, em Cristo Jesus…” (Ef.2:13)
Agora, os gentios foram aproximados de Deus (Ef.2:13). O preço dessa reconciliação foi “o sangue de Cristo” (Ef.2:13). A morte de Cristo possibilitou que tanto judeus como gentios ficassem livres da Lei judaica e se encontrassem para formar um só povo. A nação de Israel, que outrora era a nação exclusiva de Deus (Sl.148:14; Is.43:21), agora divide essa posição com a Igreja (1Pd.2:9).
A Paz aos que estavam longe (os gentios) e aos que estavam perto (os judeus) (Ef.2:13), que tinha sido proclamada por Isaias (Is.57:19), foi cumprida em Jesus Cristo. É por meio da Paz com Cristo (Rm.5:1) que alcançamos paz com o próximo e abrimos caminho para a amizade cristã (Ef.2:14). Precisamos fazer uso desse privilégio. Assim sendo, fica liberado o nosso acesso a Deus, visto que a parede de separação foi derrubada (Ef.2:14; Hb.10:22; Tg.4:8).
É bom lembrar que a união de gentios (agora Igreja) e judeus não tem um caráter universalista, mas é somente para aqueles que recebem a Jesus Cristo e creem em Seu maravilhoso nome (João 1:11-13).
CONCLUSÃO
Como vimos nesta Aula, a condição dos gentios sem Deus era de total desgraça; estavam fora das promessas divina; o Céu não os queria lá; a vida deles se resumia em somente nisto: “comamos e bebamos, porque amanhã morreremos” (1Co.15:32-NVI). Mas, agora há uma esperança, pois Jesus, através de Sua morte na cruz, proporcionou a reconciliação do homem com Deus, e as promessas de um lindo porvir abrangem a todos, judeus e gentios, desde que se reconciliem com Deus e façam parte do novo povo de Deus, a Igreja. É impossível se considerar filho de Deus sem pertencer a Igreja de Cristo, pois ela é a eleita de Deus (João 1:12; 1Ts.1:4; Ef.1:4), e somente os que estão dentro dela estão predestinados para morar no Céu (Ef.1:5).